sábado, 18 de julho de 2009

O Ministério da Magia não é invenção de J.K. Rowling


Tal como a imagem sugere, quero aqui hoje fazer uma comparação temporal num aspecto da educação. Mas com uma amplitude temporal consideravelmente menor. De um ano, mais propriamente. Entre 2008 e 2009. Para especificar um pouco mais, gostava de estabelecer a comparação entre os discursos do Ministério acerca dos resultados do exame de Matemática em 2008 e em 2009.

Nota de 2º parágrafo (por um qualquer motivo estranho, isto não soa tão bem como "nota de rodapé"): as médias das notas do exame nacional de Matemática A (a Matemática com o maior número de alunos inscritos) do secundário desceram cerca de dois valores, de 2008 para 2009. No ano passado, se bem se lembram, houve umas notas fantásticas. Este ano voltaram ao normal, continuando ainda relativamente altas. Mas é uma descida acentuada, seja como for. E, na óptica do Ministério, as super notas de 2008 é que foram normais. Apesar de sensacionalmente repentinas. Nos anos anteriores, as médias andavam 2 ou 3 valores abaixo, até mesmo em anos do Governo actual. Nesse maravilhoso ano de 2008, a genial Maria de Lurdes Rodrigues alegou que elas se deveram ao esforço dos alunos e professores, ao seu empenho na preparação do exame, que, claro, foram no sentido de acompanhar as directrizes do todo-poderoso Ministério da Educação. O exame era perfeitamente adequado, os conselhos do Ministério (que, aliás, é especialista em dizer aos professores como exercer a sua profissão - vide Manual do Aplicador a partir da página 7) é que levaram os alunos a superar a Matemática, onde comprovadamente têm dificuldades. Onde ainda tinham dificuldades em 2007, quando a média foi 3 valores inferior à de 2008.

Este ano? Uma descida considerável das notas e a duplicação das reprovações. Que estranho... Mas... Mas... Será que... O Ministério... falhou?? Não, não pode. No Ministério, até podem ter havido estas dúvidas existencias, numa primeira instância, mas numa análise mais a frio, certamente todos se lembraram que é impossível o Ministério ou o GAVE terem errado. Isso simplesmente não acontece. Foi o Sócrates que mandou. Nenhum órgão do Governo erra. E se ele manda, é para cumprir...

É perfeitamente claro que foi mais alguém a falhar. Na verdade, toda a gente fora do Governo falhou. Se fosse noutra situação, eu diria que isto era disparar em todas as direcções a ver se cai algum melro, típico de quem reconhece a culpa mas quer atirá-la para outros. Mas, calma aí, estamos a falar do Ministério da Educação e de Milú Almighty (a semelhança com o título de dois filmes de comédia é pura coincidência. Ainda se fossem tragédias gregas...). É claro que a culpa é mesmo de todos os outros, longe de qualquer pessoa ponderar sequer a hipótese de ser uma desculpa barata.

E quando digo toda a gente, é mesmo toda a gente. Baseio-me na notícia do Público sobre o assunto. Resumindo, a culpa é: primeiramente, da comunicação social, por veicular que os exames são fáceis; não bastando, é também da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), pelos seus aberrantes pareceres em que absurdamente critica o Ministério e o nível de dificuldade dos exames; dos partidos da oposição, porque... Bem, não sei bem porquê, para ser honesto. Mas a culpa também é deles. Resulta daí "menos investimento, menos trabalho e menos estudo" por parte dos alunos (conforme citação da Ministra numa outra notícia), porque esse grupo de vilões permite-se divulgar que os exames são fáceis. Que afronta! De facto, contra tantos adversários, nem o Ministério e as suas directrizes fazem milagres! Os professores e alunos bem as seguem, esse caminho florido, de alegria e felicidade, mas há sempre os lobos maus à espreita para corromper toda essa envolvente virginal e levar o mal às mentes inocentes.

Só está em jogo o futuro dos alunos, a entrada ou não na faculdade e no curso que desejam e, por sua vez, as saídas profissionais que se perspectivam nessa faculdade e nesse curso. É perfeitamente compreensível que os alunos se deixem ir nessa onda de facilitismo motivada por todos aqueles grupos de vilões. "O exame até pode ser mais difícil que o do ano passado, mas também está só em jogo o nosso futuro, por isso vamos lá facilitar no estudo e esperar que seja mesmo fácil!". Diga-se de passagem, difícil difícil mesmo era fazer um exame que fosse ainda mais fácil que o de 2008. Isto é a comunicação social a falar, claro, não falo por mim, que, como qualquer outro português, acredito piamente na competência do Ministério da Educação!

Resumindo, em 2008 o mundo era belo, as médias subitamente altíssimas, e tudo graças ao trabalho de professores e alunos, convergente com o preconizado pelo Ministério. Em 2009, surpresa das surpresas!, as médias baixam mais de dois valores. Obviamente que o Ministério continuou a trabalhar bem - não podia ser de outra maneira - e que a culpa não foi dos professores nem alunos, coitados. Muito menos o grau de dificuldade do exame variou de ridiculamente fácil para bastante fácil, de um ano para o outro. Isso então, está totalmente posto de parte. O problema foi da comunicação social, SPM e oposição (peço que continuem a não me questionar o porquê da culpa ser também da oposição), que influenciaram negativamente os alunos. Em 2008, alunos e professores trabalharam afincadamente para conseguir as subidas mágicas record das notas, e isso graças aos esforços do Ministério. Em 2009, continuariam a fazê-lo se não fossem uns quantos agentes do mal. E pronto, por isto é que as médias saltam 2, 3, 4 valores de ano para ano. Em 2008, em particular, houve uma geração de alunos fantásticos, tal que, em 2007, os planos e directrizes do Ministério ainda não fizeram efeito, mas, em 2008, já fizeram, e de que maneira! Um verdadeiro Ministério da Magia do mundo real, sem Harry Potters nem Dumbledores. Mas com uns quantos Voldemorts e Devoradores da Morte.

PS: Parece que alguém decidiu dar um exame de 1984 (salvo erro) a uma turma. Houve apenas 3 alunos a conseguir nota positiva. Com certeza que era uma daquelas turmas que é constituída só por 4 alunos... Não podia ser de outra maneira... Certo? Ah, claro, também podia ser uma turma em que todos eram filhos de profissionais da comunicação social, membros da SPM ou políticos da oposição. Esses são casos perdidos, as influências que recebem em casa matam os seus talentos matemáticos...

terça-feira, 7 de julho de 2009

Tourada


Eu sei, a imagem já está mais que batida. Mas não pude resistir a colocá-la em poster no Autocarro, junto ao validador dos passes. Nem podia deixar de trazer à conversa sobre rodas que aqui temos este assunto dos chifres que Bernardino Soares possuirá, de acordo com o ex-ministro da Economia Manuel Pinho. Numa insinuação feita na Assembleia da República (doravante, AR, para simplificar). Não sei quanto a vós, mas eu cá sei que a AR é a Casa da Democracia Portuguesa. Por isso, se Pinho afirma algo tão convictamente, permitindo-se até ilustrar o dito com um extraordinário gesto de mímica, acho que devemos levar a sério. Afinal, é a AR... Certo?

Ok, vocês não caíram. De facto, o que Pinho fez foi ilustrar na perfeição o que, na verdade, é o Hemiciclo cá do sítio: uma tourada. Com chifres (doravante, cornos, para simplificar), tudo fica mais claro. Mariano Gago já nos presenteava com uma possante dentição, típica de equinos fortes e saudáveis, ideais para uma tourada a cavalo. O Primeiro-Ministro é uma cavalgadura. Mesmo não tendo tão notável dentição. A forma arrojada de falar de Jerónimo de Sousa remete-nos facilmente para a "voz off" que anuncia os toureiros e as ganadarias. Todos os deputados que intervêm fazem-no num corajoso (?) tom desafiante, típico dos toureiros. A Ministra da Educação... Bem, a Ministra da Educação é simplesmente um asno (por vezes, também se vêem asnos nas touradas - tanto quanto julgo saber, que não é muito). Mas os cornos dissipam todas as dúvidas: o Parlamento é uma tourada. Com algumas diferenças, salvo seja: o povo, aprovando ou não o teor do espectáculo, não acha piada; os animais não sofrem (e ainda se divertem por cima, recebem bem e podem faltar ao trabalho) nem se vislumbra risco de extinção da espécie (raios!); os saloios são os protagonistas, e não o público; os activistas que tentam proteger a espécie resumem-se à própria espécie.

Confesso que, à primeira vista, na minha inocência, não discerni se o gesto de Manuel Pinho era uma referência a cornos ou orelhas de burro. Mas todos se apressaram a esclarecer que foram mesmo cornos, geralmente usados em insinuações provocatórias acerca de infidelidade marital. Achava a minha outra hipótese perfeitamente credível, mas de facto chamar outro deputado burro é vulgar demais. Este homem tinha de inovar. Afinal, era o ministro da Inovação.

No dia seguinte, Joe Berardo fez o melhor que sabe fazer: ser solidário, oferecendo emprego a um homem que todos crucificavam. Não, não, desculpem. O que Berardo melhor sabe fazer é mesmo aproveitar para ser protagonista. Oferecendo emprego a Pinho logo após a sua demissão do Governo... e fazendo questão de torná-lo público. E fê-lo de um modo muito sui generis, como é, aliás, seu apanágio. Não consigo citá-lo word-by-word, mas o madeirense terá dito algo como:

"Liguei-lhe a oferecer-lhe emprego, mas ele esteve incontactável. Por isso, falei com a mulher dele e pedi-lhe que transmitisse a minha oferta ao Manuel Pinho."

Bem, o que eu vejo aqui é um genial humor negro por parte de Berardo. Não quero especular, mas só interpreto esta menção de Berardo à mulher de Pinho e ao facto de ter contactado com ela, deixando subentendido que tem alguma confiança com ela (de outro modo, creio que preferiria ter transmitido pessoalmente ao visado algo tão importante como uma oferta de emprego... digo eu), como humor negro perante o gesto do ex-ministro, apelidando Bernardino Soares de "cornudo", com o significado que todos sabemos... Por que outro motivo ele teria especificado estes detalhes acerca de como fez chegar a sua oferta ao conhecimento de Pinho? Berardo com um requinte de humor magnífico.

Termino remetendo os amáveis passageiros para a letra da música de Fernando Tordo, uma das mais marcantes da história da música portuguesa, homónima ao título deste texto. Aqui a têm, a Tourada (clicar para seguir a ligação).

Não resisto ainda a partilhar uma gaffe matemática de Fátima Campos Ferreira, num programa que a RTP transmitiu ontem sobre a governação do elenco Sócrates. Devo ressalvar que não pretendo denegrir a imagem da dita senhora, que é inteligentíssima, caso contrário não seria habitual moderadora deste tipo de debates. Pretendo, sim, mostrar como, até numa pessoa tão inteligente, o raciocínio matemático por vezes falha em coisas muito simples, permitindo que os políticos nos ludibriem com a estatística, que, nas mãos certas (ou erradas, dependendo da perspectiva), é autêntica plasticina. Bem, na verdade, o que pretendo é partilhar um momento caricato, a que nunca pensei assistir: Nuno Morais Sarmento a fazer alguém, em particular sendo esse alguém Fátima Campos Ferreira, parecer ignorante. Confesso que fiquei fascinado com tamanho insólito. Passo a citar o diálogo:

Fátima Campos Ferreira: "Mas calma aí... O senhor [Morais Sarmento] diz que a taxa de analfabetismo desceu 50% no governo PSD de que o senhor fez parte, mas o valor cifrava-se em 47%... Como é possível ter descido 50%?"

Nuno Morais Sarmento: "Obviamente, desceu de 47% para 23,5%..."