sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Sexiness

Cortesia da Sofy e do Eterno Diadema, o Autocarro Copa D recebeu o selo de "blogue sexy". Hesitei entre escrever um "sexy blog" anglo-saxónico, um "blog sexy" soma de anglo-saxónicos ou um "blogue séxi" neologista, mas optei por um misto "blogue sexy". Não gosto do efeito produzido pelas palavras "blog" e "séxi". Não importa se "blogue sexy" é incoerente, meio inglês meio aportuguesado. Blogue sexy eu quero, e blogue sexy será!

Acerca deste honroso galardão, reconheço que não tinha discurso preparado. Como tal, vejo-me forçado a uma torrente espontânea de vocábulos. O que me dá um certo jeito porque já queria voltar a mandar aqui umas papaias, mas ultimamente não tem surgido não só o tempo como também o tema para isso.

Assim sendo, ocorre-me dizer, em resposta à pergunta típica "o que pensa fazer com o prémio?", que esta preciosidade filatélica vai directa para junto do selo da Infanta D. Carlota Joaquina. Cuja sensualidade, aliás, não era inferior ao da pin-up visível no selo de blogue sexy. As armações que usava no cabelo talvez dificultassem ou, no mínimo, tornassem perigosos certos momentos de romance e intimidade, mas isso não lhe retira qualquer mérito.

Hesito, contudo, entre guardá-lo em tão prestigiado local e substituir por ele o selo do imposto do autocarro. Pelo menos enquanto ninguém se lembrar de cobrar imposto por sexiness. Chegará o dia, mas só quando o Primeiro-Ministro não for considerado o sexto homem mais sexy da política.

Curiosamente, perguntaram-me hoje como é que eu conseguia escrever tanto e porque é que não conseguia reduzir os textos, a propósito de um excesso meu num trabalho com limite de palavras, que excedi pela 3ª vez em 3 trabalhos. Creio que a atribuição deste selo dá um bom mote para dissertar - rapidamente, prometo - acerca da minha escrita, parafraseando a resposta que dei aos meus amigos.

Tentei explicar-lhes que não conseguia excluir nada do que tinha escrito. Quando tenho limites, vou cortando muitas coisas e atalhando outras, mas chego sempre a uma altura em que não consigo cortar mais. Aos meus olhos, o texto perde valor e, por vezes, lógica. Vou descarregando fluidamente as ideias que considero pertinentes e escrevo-as usando a forma e as palavras que acho melhores para as transmitir. Tem de ser elaborado e funcional. Artificial e directo. Para tal, torna-se difícil simplesmente fazer um resumo de raíz do próprio texto, como me sugeriram. Quero que as ideias fiquem todas, para o texto ter o máximo de valor e significado (nem que seja só para mim) que eu lhe consigo dar, e cada ideia está transmitida da maneira mais coesa e fidedigna para com o que tenho na mente que eu consigo fazer, coesão que se perdia se tentasse resumir as ideias. E é aquela coesão que faz a ideia ter valor. É um ciclo vicioso, um multiplicador. Chegado a certo ponto, atalhar ideias e eliminar certas expressões é perder o texto. Porque o "eliminável" é geralmente o mais artificial - e é o artificial que dá cor a um texto.

Se explico uma tese, tento construir um asfalto liso que leve o leitor a essa tese. Quando dou por mim, se retiro ideias, passo a ficar com uma estrada de paralelos. O leitor chega ao destino, mas aos trambolhões. Uma ideia complementar ou expressões algo mais artificiais nas ideias principais solidificam a estrada. Homogeneízam e desenevoam a pintura. É assim que os meus trabalhos, regra geral, excedem os limites. Diga-se de passagem que a pequena plateia que me interpelou não ficou lá muito convencida com as minhas explicações...

Já se, como muitas vezes acontece neste blog, pego em duas ou três ideias soltas que queria passar para um texto leve, começo a divagar. Invento relações dessas ideias com novas ideias, e dessas novas com outras, numa espiral que, assim houvesse tempo, não teria fim. É a divagação aquele artificial que enriquece o texto. Não desenevoa nada (às vezes, faz o contrário), mas é o inesperado que surpreende e mantém um certo véu do mistério sobre a ideia principal. Sim, que pode sempre existir uma linha de raciocínio patente mesmo num texto que surgiu de um conjunto de ideias soltas.

A linha de raciocínio está lá, e (res)surge nos momentos mais surpreendentes. Quando já parecia esquecida, ultrapassada ou simplesmente desvanecida.

E assim se obtém um texto sexy.

Ainda que, por força das circunstâncias, as divagações deste tenham sido menos coloridas e mais descritivas e secantes do que é desejável.

À Sofy, a retribuição do reconhecimento de blogging sexiness.

À Leopoldina, um tão surpreso quanto típico "estás tão crescida desde a última vez que te vi!".

terça-feira, 3 de novembro de 2009

A Nereida de Virgílio


Não, não é um post sobre a Nereida. Descansem. Não se trata disso, por muito que a virilidade seja um requisito obrigatório de um motorista, ficando somente atrás do camionista. Mas só porque as empresas de transportes públicos não permitem que penduremos calendários Pirelli e páginas centrais da FHM no vidro. O sindicato (claro que há um sindicato para os motoristas, como podia não haver?) já tentou explicar milhares de vezes que um vidro daquele tamanho serve para alguma coisa, mas eles parece que não entendem!

Mas, retomando a ideia inicial, claro que não vamos enveredar por caminhos duvidosos neste casto blogue. Aliás, não imaginam o trabalhão que deu encontrar uma fotografia da senhora envergando uma quantidade de tecido moralmente aceitável. E não, não é a mesma coisa. A Cláudia tem muito mais classe.

Agora que usei o adjectivo "casto", podia fazer mais uma inevitável divagação e escrever umas linhas conectando os trabalhos fotográficos da modelo e actriz francesa Laetitia Casta e a definição de "castidade" do dicionário (cito: "Abstinência total de pensamentos, palavras e obras sensuais."), mas vou abster-me, usando um verbo adequado, de o fazer. A verdade é que este post surge inspirado por um trocadilho absolutamente divinal. O mais magnífico que ouvi nos últimos tempos.

Um senhor responsável por um quiosque, querendo explicar que o livro que acompanhou a última edição do Expresso foi a Eneida, de Virgílio, afirmou convictamente que era não a Eneida, mas sim a Nereida que vinha com o dito jornal. Lembro-me de ter pensado duas coisas: 1) "Hmm... Desconhecia esta (pequena) mudança da linha editorial do Expresso." ; 2) "Você não disfarça nada as suas leituras, meu bom homem... E leituras é como quem diz, não é verdade?..."

É certo que a comicidade deste trocadilho resulta não só da tenra idade do dito senhor, do seu esbelto bigode, do ar sério e decidido com que fez a dita afirmação nem mesmo da ligação de uma namorada de Cristiano Ronaldo a uma obra épica de um íntegro e respeitável escritor do século I a.C.. Sim, é certo que a obra não foi mais do que propaganda encomendada pelo Imperador César Augusto, mas Virgílio não deixa de ser íntegro por isso. Era escrever ou ser atirado aos leões, por isso creio que fez uma boa opção. Ainda que nada altruísta. Toda a gente sabe que o povo gosta mais de ver leões deliciando-se com um bom petisco humano do que de ler um livro.

Mas, dizia eu, a comicidade resulta também do próprio nome: Nereida. Tem uma sonoridade... cómica, simplesmente. Funciona. É como "jacaré". São palavras que, se estivermos num stand-up e já não fizermos a mínima ideia do que dizer, fazem magia. E é um nome "divagável". Percebe-se que não é apenas um nome, como Letizia, por exemplo. Percebe-se que deve significar algo. E, pensando assim, antes de ir à Wikipedia, ninguém sabe bem o que será uma Nereida. Será que se pesca uma Nereida? Será que encontrar uma nota de 20 euros no chão é uma Nereida? Será que se vendem Nereidas na praça? Será que dá para fazer música com uma Nereida? Este nome, meus amigos, é plasticina pura! É de uma versatilidade imensa. A Nereida, meus caros, é o que um homem quiser. Desde que ele seja um futebolista de topo, claro.

Fui, então, à gloriosa Wikipedia e descobri que as Nereidas eram, na verdade, as ninfas filhas de Nereu e Dóris, na mitologia grega, e que ninguém sabe ao certo se eram 50 ou 100. É o que os advogados chamam de dúvida razoável. É compreensível que se dê uma margem de dúvida, afinal de contas estamos a falar de uma insignificante diferença de 50 ninfas. E, pasme-se!, elas surgem desnudadas na maioria das gravuras, por entre golfinhos e nenúfares (nenúfar - outra palavra infalível).

Essa maravilhosa biblioteca digital informa-nos ainda que Nereida é igualmente o nome de um satélite de Júpiter. Resolvi partilhar essa informação com o meu colega dos turnos da madrugada, o Zé Antunes. Ao que ele, ensonado, me resmungou bruscamente uma frase qualquer que me pareceu incluir algo como "os satélites da espanhola".

Beijos, abraços e Nereidas a todos.